sábado, 9 de fevereiro de 2008

Patricia, a dignidade mapuche


«Nuevos abusos con los pobres índios:
quieren desalojarlos de sus tierras
de las últimas tierras que les quedan!
Siendo que son hijos de la tierra.»
(Nicanor Parra)

Patricia Troncoso, conhecida como “La Chepa”, é auxiliar de uma escola de crianças, no sul do Chile. Estudou teologia no Instituto de Ciências Religiosas da Universidade Católica de Valparaiso. Pelas suas origens mapuches, aproximou­‑se dessas comunidades, buscando as suas próprias raízes, primeiro na zona do Alto Bío-Bío e depois fazendo parte da Coordenadora Arauco-Malleco (CAM), na cidade de Traiguén.

Sofreu o primeiro processo em Outubro de 2002, acusada, juntamente com dois outros dirigentes mapuches, de incêndio de uma fazenda, tendo sido absolvida. Dois meses depois, sofreu um novo processo, acusada de ser membro da CAM, organização mapuche colocada na ilegalidade – em pleno regime “democrático” pós­‑pinochetista –, por ser considerada uma “associação ilícita terrorista”. Depois de dois outros processos, Patricia foi novamente declarada inocente, além de que houve retratação por ter sido perseguida como membro da CAM. Mas um novo processo, em 2004, condenou-a por “incêndio terrorista” da fazenda Poluco Pidenco da Forestal Mininco, a 10 anos de prisão juntamente com outros seis dirigentes mapuches, pela Lei de Segurança Interna do Estado e pela Lei Antiterrorista, criada pela ditadura de Pinochet e retomada pelo governo socialista de Ricardo Lagos.

Foram também condenados a pagar 420 milhões de pesos (cerca de 840 mil dólares) à empresa florestal, de propriedade do grupo Matte, dos mais privilegiados durante a ditadura pinochetista e que aufere lucros colossais na exploração de madeira nas reservas mapuches. «...os lucros da indústria florestal aumentaram na proporção directa da criminalização das reivindicações mapuches por parte do Estado e das próprias empresas florestais», como afirma Mauricio Buendia em artigo publicado este mês em Punto Final.

Esses lucros subiram de mil milhões, oitocentos e vinte e nove mil dólares em 1997 para quatro mil e oitocentos milhões de dólares em 2007, coincidindo com a política de criminalização dos mapuches e os processos conforme a Lei de Segurança Interna do Estado e a Lei Antiterrorista.

Patricia concluiu vitoriosamente uma greve de fome de 112 dias, simplesmente para ter o direito de, após cumprir 5 anos da condenação – por, sendo mapuche, povo originário do Chile, defender as suas terras da invasão de empresas transnacionais, que lhes expropriam as terras, a água, a vida –, cumprir o resto da sentença em regime semi-aberto. Foi a segunda greve de fome; a anterior durou 63 dias. Nesta, ela emagreceu 25 quilos, mas não a abandonou – demonstrando a convicção que todos os que apelam a esse método de luta deveriam ter – até conseguir o reconhecimento pleno das suas reivindicações pelo governo chileno.

O que ela conseguiu foi simplesmente que possam os presos mapuches continuar a cumprir as suas penas em regime semi-aberto e outros direitos mínimos. Eles sofrem penas e condições de prisão a que não estariam submetidos se tivessem sido processados pelas leis normais do Chile e não pela legislação ressuscitada do pinochetismo.

A Igreja chilena fez a mediação para que se chegasse à solução de aceitação das demandas de Patricia, quando o governo chileno sentiu a grande mobilização nacional e internacional de solidariedade com a líder mapuche. Porém, o temor de Patricia é que, tal como na greve de fome anterior, o governo não cumpra os compromissos assumidos. Assim, uma Comissão de organizações internacionais visitará proximamente o Chile para, junto com representante da Igreja chilena, controlar se o governo estará a cumprir desta vez com a sua palavra.

A dignidade mapuche saiu vitoriosa da greve de fome, como maneira de chamar a atenção sobre a militarização de algumas comunidades mapuches, de invasões sistemáticas das suas terras, de agressões e assassinatos, além da expropriação das suas fontes de água. Tudo para viabilizar a exploração dessas zonas por empresas transnacionais, privilegiadas no modelo económico neoliberal chileno.

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