quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Tropas da ONU são acusadas de violações de direitos humanos


No dia 15 de Outubro de 2007, o Conselho de Segurança da ONU decidiu estender o mandato da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH), até 15 de Outubro de 2008. Em nota divulgada dia 16 de Outubro de 2007, o Ministério das Relações Exteriores afirma que, «o governo brasileiro recebeu, com satisfação, a decisão». O exército brasileiro tem a função de coordenar as forças da MINUSTAH, composta por cerca de nove mil soldados. Porém, há pouco debate na sociedade brasileira sobre o papel do Brasil na ocupação do Haiti e, principalmente, sobre as denúncias de participação das tropas da ONU em violações de direitos humanos.

Um dos casos documentados por organizações haitianas de direitos humanos foi o massacre ocorrido dia 22 de Dezembro de 2006 na comunidade de Cité Soleil, após a organização de um protesto de cerca de dez mil pessoas que demandavam o retorno do presidente Jean-Bertrand Aristide ao país e a saída das forças militares estrangeiras. Segundo relatos da população local e imagens em vídeos produzidos pela organização Haiti Information Project – HIP (Projecto de Informação do Haiti), as forças da ONU atacaram a comunidade e mataram cerca de 30 pessoas, inclusive mulheres e crianças.

Em resposta às críticas das organizações de direitos humanos que denunciaram o massacre, a MINUSTAH justificou as suas acções com o pretexto de combater supostos gangues em Cité Soleil. Porém, as imagens gravadas pelo HIP revelaram que as tropas da ONU atiraram a partir de helicópteros contra civis desarmados. A agência de notícias Inter Press Service (IPS) documentou a situação da comunidade logo após o ataque e registrou marcas de balas de grosso calibre em muitas casas. O director do HIP, Kevin Pina, acusa a MINUSTAH de actuar em conjunto com a Polícia Nacional Haitiana em execuções sumárias e prisões arbitrárias e avalia que, «neste contexto, é difícil continuar a ver a missão da ONU como uma força independente e neutra no Haiti».

Em entrevista à jornalista Claudia Korol para a agência Adital, Camille Chalmers, professor da Universidade do Haiti e membro da Plataforma Haitiana para a Articulação de Movimentos Sociais, explica que «a MINUSTAH tentou construir legitimidade dizendo que estão a lutar contra bandidos. Mas muita gente percebe que a única coisa que pode realmente reduzir a insegurança são políticas públicas e serviços sociais. Ao contrário, o que temos é um aparato militar violento» [1].

Outra operação militar violenta ocorreu em Julho de 2005. Nesta ocasião, foram registradas 22 mil marcas de tiros durante um ataque da MINUSTAH a Cité Soleil. Os informes do HIP citam depoimentos de moradores denunciando que foram encontradas pessoas mortas e feridas dentro das suas casas. Estes depoimentos revelam que os soldados atiraram indiscriminadamente contra a comunidade, causando um efeito devastador, já que as condições de habitação no local são extremamente precárias. Denunciaram ainda que a MINUSTAH não permitiu a entrada da Cruz Vermelha, o que significa uma violação da Convenção de Genebra.

Documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos, obtidos por organizações de direitos humanos através de demanda judicial baseada no Acto de Liberdade de Informação, demonstram que a embaixada estadunidense sabia que as tropas da ONU planejavam um ataque a Cité Soleil. Organizações sociais locais avaliam que o objectivo dos militares era impedir uma manifestação popular no dia do aniversário de Aristide, que ocorreria em 15 de Julho.

Um relatório elaborado pelo Project Censored (Projecto Censurado) estima que mais de mil membros do Lavalas, partidários do presidente Jean-Bertrand Aristide, foram presos e cerca de oito mil pessoas foram assassinadas durante o chamado “governo interino”, que controlou o país de 2004 a 2006, a partir do golpe contra Aristide, em 29 de Fevereiro de 2004. Camille Chalmers caracteriza esta acção como uma «intervenção liderada pelos governos dos Estados Unidos e da França». E explica que «solidariedade com o povo do Haiti é ajudar a reconstruir o país, a responder aos problemas sociais mais angustiantes, mas a presença dos militares não ajuda. Os objetivos de alcançar a segurança e os direitos humanos não foram alcançados. Ao contrário, pensamos que a presença da MINUSTAH constitui uma violação do direito à autodeterminação do povo do Haiti».

Mais recentemente, em 2 de Fevereiro de 2007, as tropas da ONU realizaram outra operação em Cité Soleil, que resultou na morte de duas jovens que dormiam em sua casa. Em 7 de Fevereiro, diversas manifestações populares ocorreram no país e, em 9 de Fevereiro, novamente ocorre um ataque militar naquela comunidade, denunciado por organizações locais, como o Instituto para a Justiça e a Democracia do Haiti (IJDH).

No dia 30 de Outubro de 2007, foi divulgado o sequestro da Dra. Maryse Narcisse, que pertence à direcção nacional do Lavalas e trabalhava com programas sociais de saúde e educação no Haiti. Outro membro do Lavalas, o psicólogo e defensor dos direitos humanos Lovinsky Pierre-Antoine, desapareceu no dia 12 de Agosto. Organizações locais acusam as tropas de ocupação da ONU de gerar instabilidade política e atacar defensores da democracia e dos direitos humanos no país.

Entre os dias 23 de Junho e 3 de Julho de 2007, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), realizou uma missão de observação no Haiti e constatou que a MINUSTAH exerce um papel «violento» e «constrangedor», que não pode ser caracterizado como «acção humanitária». O advogado Aderson Bussinger Carvalho, responsável pelo relatório, defendeu a retirada das tropas brasileiras do Haiti. «A conclusão a que eu cheguei é que a presença das tropas no Haiti não é humanitária. É uma missão estritamente militar. O país tem uma história de ocupações e o Brasil acaba exercendo um papel nesse histórico», afirmou Carvalho em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, em 4 de Setembro de 2007.

O papel dos militares latino-americanos no Haiti hoje é semelhante à força multilateral que permaneceu na República Dominicana após a invasão dos Estados Unidos em 1965. A República Dominicana viveu um longo período de ditadura militar até 1961, com a morte do ditador Rafael Trujillo. Em 1962, Juan Bosch é eleito presidente, mas é deposto por um golpe militar após sete meses de governo. Em Abril de 1965, uma série de manifestações populares pede a volta do ex-presidente Juan Bosch. Foi neste período que o presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johnson, ordenou uma invasão militar à República Dominicana, com cerca de 20.000 marines. Algumas semanas depois, a Organização dos Estados Americanos (OEA) envia a “Força Interamericana de Paz”, composta por 1.129 soldados. Naquele período, quando o Brasil vivia sob uma ditadura militar, a função das tropas brasileiras na República Dominicana era semelhante à que exercem actualmente no Haiti.

As diversas denúncias sobre o papel negativo que as tropas da ONU exercem no Haiti não são levadas em conta pelo governo brasileiro. Sob o pretexto de tentar conseguir um assento no Conselho de Segurança da ONU (o que seria muito improvável actualmente), a política brasileira em relação ao Haiti serve para legitimar um golpe de Estado e reforçar os interesses do governo dos Estados Unidos na região.

1 comentário:

SAM disse...

Caro colega bloguer,

O dia 10 de Dezembro é o Dia Internacional dedicado ao tema dos Direitos Humanos.

Depois de uma pequena procura no google, encontrei o seu blog e gostaria de lhe convidar a ser uma parte central desse empreendimento, para que todos possamos deixar a nossa marca nesse dia e, juntos, demonstrar a todos que somos Um mundo, Uma vida.

Acredito que cada um de nós, seres humanos conscientes, teremos as nossas preocupações, mais ou menos específicas, e, por isso mesmo, deveremos tentar, juntos, deixar uma marca.

Por isso, convido-lhe a ir a www.fenixadeternum.blogspot.com e ver como poderá participar dessa rede cujo que se mantém por uma única causa: a causa do Género Humano, a causa dos Direitos Humanos.

Obrigado,
Sam

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